top of page

[COLUNA] O problema não é Gabriel Diniz cantar Chico Science...

Contexto: “o cantor Gabriel Diniz (GD) irá se apresentar na prévia carnavalesca “De Bar em Bar” no próximo dia 23 de Janeiro. O artista prometeu cantar sucessos do frevo, como “Hino do Elefante de Olinda”, “Voltei, Recife” e etc. Além disso, GD também irá homenagear Chico Science, com “A Praiera”, “Manguetown” e “A Cidade”.

Essa notícia foi compartilhada hoje (06/01) pelo portal NE10 no facebook. Acontece que a reação foi a que todos nós esperávamos, com fãs de Chico e do movimento Mangue extremamente indignados com a decisão do cantor, muitos utilizando do pretexto de que Gabriel não merece interpretar essa figura folclórica da nossa cultura. Antes de você tomar qualquer pensamento, te convido a de fato refletir sobre o que isso representa.

Desconsiderando toda a questão de direitos autorais (que de fato não sei se encaixa na situação, e, se sim, como procederia), não tomo por correto “censurar” a liberdade de expressão artística. Se GD quer interpretar Chico, (in)felizmente – havendo legalidade autoral durante o processo, caso necessário – não há muito o que se fazer. O que me deixou encasquetado com toda essa história foi ter que ver Gabriel Diniz, durante o carnaval do Recife, ser o único a levantar a bandeira para a interpretação e homenagem a Chico Science e o Movimento Mangue, justamente num ano que deveria ser saudosista a uma das grandes lendas da música local.

Não questiono o talento de Gabriel. É verdade que não sou fã do seu gênero musical e nem de suas músicas, mas isso não me dá o direito e nem é motivo suficiente para rechaçar o cara. Há quem goste? Sim! Até por conta disso que ele faz tamanho sucesso por todo o Brasil. Pessoalmente vejo a vontade do cantor de interpretar Chico, durante o carnaval pernambucano, como algo muito ousado mesmo, que claramente foge da zona de conforto de GD, e em parte vejo essa atitude como algo louvável, mas não estamos aqui para refletir sobre isso.

Gabriel Diniz ser o intérprete de músicas como “Manguetown”, “A Cidade” e “A Praiera”, é o retrato claro de que tudo aquilo deixado por Chico vem caindo no limbo da memória cultural do nosso estado. O Manguebeat, maior movimento cultural do país nos anos 90 e em parte responsável por recolocar o nosso estado no mapa do Brasil, some a cada ano que passa, é esquecido juntamente com o seu criador. Não que seja necessário sairmos as com guitarras e toadas de maracatu, mas simplesmente reviver os valores deixados por Science através de sua música.

Foi algo como se nos anos 90’, com Chico em destaque, tudo aquilo fosse respirado 24hrs por dia, sete dias por semana. Alguns anos depois, nada mais, e toda essa separação aconteceu por pequenos atos, como o desligamento de Gilmar Bola 8 da Nação Zumbi no final do ano passado. Pense que não, mas Gilmar é uma figura fundamental em todo o Movimento Mangue desde o seu embrião, ao lado de Chico, Du Peixe e Zero Quatro, as três figuras mais conhecidas.

Aliás, o Carnaval de 2016 ficou ameaçado de não contar com a presença do grupo liderado por Jorge Du Peixe. Mais para o fim do mês de Outubro, a banda afirmou que ninguém havia entrado em contato para convidá-los a participar do evento, algo que aconteceu logo depois, com muita pressão popular, confirmando assim o show de NZ no dia 29 de Dezembro.

Se a cena Mangue está morrendo, Gabriel Diniz não tem nada a ver com isso. A atitude de interpretar as músicas de Chico são puramente comerciais, para cativar o público, e isso é nítido. Entretanto, a partir do momento que vemos artistas como Gabriel encabeçarem canções capazes de contar a história recente de um povo, capazes de representar um dos maiores movimentos culturais do Brasil, algo está errado.

No final das contas, pensando dessa maneira, não é errado tomar por louvável a atitude de GD de reinterpretar as músicas de Science, mas sem sombra de dúvidas é triste perceber que a cena depende de tais atitudes de tais artistas para que possa ser lembrada... E somente durante o carnaval.

Comments


Curte aí:

Nossos Parceiros:

bottom of page